terça-feira, fevereiro 10, 2009

Dois dias

Já fazem dois dias que não o vejo. Saiu pela porta nervoso. Bateu com tanta força que achei que ia desfazê-la em migalhas. O meu coração ta assim, em migalhas. E pra piorar ele some.

É que brigamos, sabe. Feio. Acho que toda briga é feia, aliás. Sabe daquelas que num tem nem culpado e as partes saem igualmente machucadas? Pois é. Foi uma dessas. São as brigas mais difíceis. Mais dilacerantes.

A casa é nova. Não, não é propriamente nova, mas é nova pra mim. Acabei de me mudar. Não dava mais pra viver com aquelas meninas. Criavam muitos problemas pra mim. Já estava entrando em colapso quando vi o anúncio no jornal. Telefonei umas três vezes pra conseguir falar com o vendedor. Foi quando ouvi a voz dele pela primeira vez.

Ele parecia gentil, suave, sabe. De primeira só gostei da voz, mas quando nos encontramos, pra ele me mostrar a casa, foi outra coisa. Outra sensação, outra... Não sei descrever. Minha pulsação aumentou e minhas pupilas se abriram atentas. Uma adrenalina controlada e profundamente prazerosa. Não havia nunca experimentado tamanha sensação. O que foi isso?!...

Então conversamos um pouco. Ele me mostrou o ambiente e me falou da vizinhança. Sem perceber eu já estava deixando os cabelos me caírem sobre os olhos charmosamente. Minha postura mudara e meu modo de falar nunca esteve tão comedido. Nem percebi, mas fazia charme pro tal moço. E ele... ele percebia.

Ele é assim mais ou menos da minha altura. Os cabelos lisos despenteados e por cortar. A barba é realmente mal feita, creio que não haja tempo. O vestuário é simples. Calça jeans e camisa de uma cor só. Nesse dia era verde, minha cor predileta. Os olhos são um pouco caídos mas com um ar de brincadeira. Nada nele parece ser pesado ou sério demais. Nada nele parece ser difícil ou ruim.

Aí meu charme deu certo. Saímos algumas vezes. Outras mais e já estávamos o suficientemente íntimos, rs. Ele é uma graça. Faz coisas que nunca vi homem nenhum fazer. Quando vem pra cá sempre me traz uma florzinha que eu boto num vasinho na sala. A casa fica mais bonita quando ele vem. O tom de amarelo de fim de tarde permeia o ambiente. Fica lindo.

Mas, faz dois dias que não o vejo. Ontem me deu a sensação de que nunca mais o verei. Hoje o fim de tarde foi azul frio. E... Um minuto, a campainha tocou. Vou ver.

... Pronto! Num preciso mais me preocupar. Ele chegou. Vamos conversar e acertar as coisas. Depois mando notícias. Bejos.



Foto: Juliana Buli

--

Este texto foi inspirado num ensaio fotográfico que minha irmã, Juliana Buli, fez no Prado, bairro onde mora em BH. Visite o site dela e descubra suas outras artes.


2 comentários:

Jaya Magalhães disse...

"É que brigamos, sabe. Feio. Acho que toda briga é feia, aliás. Sabe daquelas que num tem nem culpado e as partes saem igualmente machucadas? Pois é. Foi uma dessas. São as brigas mais difíceis. Mais dilacerantes."

Vivi isso semana passada.

E doeu um dia inteiro, até que ele aparecesse. E as contas fossem acertadas. E foram.

Adorei a narração, mineira.

Saudades que eu tava de te ler assim. Fiquei querendo um "poema que voa", de sobremesa. Pode?

Besos.

. fina flor . disse...

ufa, que bom que voltou, coisas mal resolvidas sempre doem mais......

beijos, querida

MM.

>>> bonito teu espaço